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O Blog Educar com Cordel é editado pelo poeta e escritor Paulo Moura, Professor de História e Poeta CORDELISTA. Desenvolve o projeto EDUCAR COM CORDEL que visa levar poesia e literatura de cordel para as salas de aula, ensinando como surgiu a Literatura de Cordel, suas origens, seus estilos, suas heranças. O Projeto Educar com Cordel é detentor do Prêmio Patativa do Assaré de Literatura de Cordel do MINC (Ministério da Cultura).

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O cangaço na moda

» LIVRO
O cangaço na moda
 

Publicado em 26.08.2010
Diana Moura diana@jc.com.br


No meio da paisagem tantas vezes cinza do Sertão, os cangaceiros pareciam hordas coloridas rumando pela caatinga. Não fosse o terror que despertavam, causariam espanto pelos matizes das vestimentas, bordadas e cheias de enfeites. Em 1928, quando Lampião entrou em Tucano (BA), um jornalista escreveu para o jornal A Tarde que eles entravam cantando suas modas e se trajavam como um “dantesco Carnaval”. E o Correio de Aracaju, em 1929, noticiava: “Lampião está em Sergipe com a sua espetaculosa indumentária”. Impressionado com essas informações que coletou ao longo de 40 anos de pesquisas, o historiador Frederico Pernambucano de Mello reuniu boa parte delas no livro Estrelas de couro: A estética do cangaço, que é lançado hoje, às 17h30, no Museu do Estado de Pernambuco.
“Eu comecei a pesquisar o cangaço usando um referencial jurídico e sociológico. Aos poucos, me vi assaltado pela estética. Do ponto de vista sociológico, considera-se que os ladrões mimetizam a sociedade, querem confundir-se com ela, para passar despercebidos. No cangaço, acontecia o contrário”, explica Frederico, comentando que a vestimenta era uma forma de distinção. Para entrar nesse campo, o pesquisador aderiu a métodos de análise mais freyreanos, reunindo informações interdisciplinares, misturando estética, história e sociologia.
O livro é uma edição na qual o termo “ricamente ilustrada” se encaixa perfeitamente. As imagens, entretanto, não foram colocadas gratuitamente. Além da enorme quantidade de fotografias, a obra traz muitas ilustrações – assinadas pelo arquiteto Antônio Montenegro –, que explicam de forma minuciosa a riqueza de detalhes do universo que acompanhava o cangaço. Roupas, cintos, cartucheiras, alpercatas, chapéus, bornais, perneiras e outros acessórios são mostrados em fotografias e desenhos de alta qualidade gráfica.
Apesar da profusão de cores e acessórios, as vestimentas não são apenas enfeites. As peças conjugam, com exímio equilíbrio, valores funcionais e estéticos. Nos dois casos, há referências que derivam da roupa dos vaqueiros, sendo exacerbados os ornamentos. Essa influência facilitava a mobilidade do cangaceiro na caatinga. A roupa protegia do sol e dos insetos. Os adereços em couro protegiam da vegetação espinhenta. Outro ponto positivo era a utilização dos bornais, colocados cruzados sobre o tórax, que distribuía melhor o peso de armas e mantimentos ao longo do corpo.
No prefácio da obra, Ariano Suassuna lembra que a moda dos cangaceiros começou a ser copiada pelas forças policiais e militares que combatiam o banditismo no Sertão. O presidente (governador) João Suassuna, da Paraíba, pai do escritor, modificou o uniforme dos soldados, trocando a bota por alpercatas e perneiras (como na foto ao lado), por exemplo. O chapéu de couro também passou a fazer parte da farda.
Aos poucos, militares da Paraíba, Pernambuco e Bahia começaram a se parecer com os cangaceiros, o que causou um mal estar com os líderes policiais, situados nas capitais, todas litorâneas. “Houve uma disputa pelo poder simbólico. O policial queria agregar para si valores da coragem do cangaço, mas para as autoridades a semelhança era inadmissível”, explica Frederico.
A estética, em meio aos bandos, também tinha uma função votiva e religiosa. “Algumas peças cumpriam papel de amuleto e talismã. Eles também carregavam orações dentro de saquinhos de pano costurados, presos a cordões, junto ao corpo. Era uma forma de se proteger, mesmo aqueles que não rezavam. Os hábitos fazem parte do catolicismo popular, que dominou o Sertão no século 19, que foi muito combatido pelo catolicismo oficial de Roma, explica. Por conta do exímio trabalho de pesquisa e pelo delicioso texto que o acompanha, o autor mereceu de Ariano Suassuna o seguinte elogio: “(Se não fosse escritor), não seria outro, senão este Estrelas de couro, de Frederico Pernambucano de Mello, o livro que eu gostaria de ter escrito”. Nada mal.

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